Vasculite Sistémica Primária Juvenil Rara 


Versão de 2016
diagnosis
treatment
causes
Rare Juvenile Primary Systemic Vasculitis
Vasculite Sistémica Primária Juvenil Rara
Poliarterite nodosa, Arterite de Takayasu, Granulomatose com poliangeíte, Angeíte Primária do Sistema Nervoso Central
evidence-based
consensus opinion
2016
PRINTO PReS
1. O QUE É A VASCULITE
2. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
3. VIDA QUOTIDIANA
4. POLIARTERITE NODOSA
5. ARTERITE DE TAKAYASU
6. VASCULITES ASSOCIADAS AO ANCA: Granulomatose com poliangeíte (Wegener, GPA) e poliangeíte microscópica (PAM)
7. ANGEÍTE PRIMÁRIA DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL
8. OUTRAS VASCULITES E DOENÇAS SEMELHANTES



1. O QUE É A VASCULITE

1.1 O que é?
A vasculite é uma inflamação das paredes dos vasos sanguíneos. Vasculites inclui um vasto grupo de doenças. O termo "primária" significa que o vaso sanguíneo é um dos principais alvos da doença, sem nenhuma outra doença subjacente. A classificação das vasculites depende principalmente do calibre e do tipo de vasos sanguíneos envolvidos. Existem muitas formas de vasculite, variando desde ligeira a potencialmente fatal. O termo "rara" refere-se ao fato de que este grupo de doenças é muito pouco comum na infância.

1.2 É uma doença comum?
Algumas das vasculites primárias agudas são doenças pediátricas bastante comuns (por exemplo a < l=8*t1>púrpura de Henoch-Schönlein e a < l=7*t1>doença de Kawasaki), enquanto que outras doenças descritas abaixo são raras e a sua frequência exata é desconhecida. Por vezes, os pais nunca ouviram o termo "vasculite" antes de ser diagnosticada na criança. A púrpura de Henoch-Schönlein e a doença de Kawasaki são descritas nas suas próprias seções.

1.3 Quais são as causas da doença? É hereditária? É infeciosa? O seu aparecimento pode ser prevenido?
As vasculites primárias habitualmente não afetam os membros da mesma família. Na maioria dos casos, o doente é o único afetado numa família, sendo muito pouco provável que os irmãos tenham a mesma doença. É mais provável que a combinação de diferentes fatores desempenhe um papel na ocorrência da doença. Pensa-se que vários genes, infecções (atuando como desencadeantes) e fatores ambientais possam ser importantes para o desenvolvimento da doença.
Estas doenças não são infeciosas e não podem ser prevenidas nem curadas, mas podem ser controladas, ou seja, quando a doença não está ativa os seus sinais e sintomas desaparecem. Este estado designa-se por "remissão".

1.4 O que acontece aos vasos sanguíneos na vasculite?
A parede dos vasos sanguíneos é "atacada" pelo sistema imunitário do organismo, fazendo com esta fique inflamada e ocorram perturbações estruturais. O fluxo sanguíneo é afetado formando-se coágulos nos vasos sanguíneos inflamados. Juntamente com o edema das paredes vasculares, este efeito pode contribuir para o estreitamento ou oclusão do vaso sanguíneo.
As células inflamatórias da corrente sanguínea aderem à parede dos vasos sanguíneos causando mais lesões nos vasos assim como no tecido circundante. Isto pode ser observado na biópsia de amostras de tecido afectado.
A própria parede dos vasos sanguíneos também se torna mais "permeável" permitindo que o líquido no interior dos vasos extravase para os tecidos circundantes, causando edema. Estes efeitos são responsáveis por vários tipos de erupções e alterações cutâneas, observadas neste grupo de doenças.
Uma diminuição do aporte sanguíneo através de vasos sanguíneos estreitados ou obstruídos ou, menos frequentemente, com ruptura da parede dos vasos cursando com hemorragia, pode causar lesão nos tecidos. O envolvimento dos vasos sanguíneos que irrigam órgãos vitais como o cérebro, rins, pulmões ou o coração, pode tornar-se um problema muito grave. A vasculite generalizada (sistémica) é normalmente acompanhada por uma extensa libertação de moléculas inflamatórias, provocando sintomas gerais, tais como febre, mal-estar, e exames laboratoriais alterados que sugerem a presença de inflamação: velocidade de sedimentação eritrocitária (VS) e proteína C-reativa (PCR). As alterações na forma dos vasos sanguíneos, nas artérias de maior calibre, podem ser detetadas através de angiografia (um procedimento de investigação radiológica que permite ver os vasos sanguíneos).


2. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

2.1 Quais são os tipos de vasculite? Como é a vasculite classificada?
A classificação das vasculites nas crianças baseia-se no calibre dos vasos sanguíneos envolvidos. A vasculite em vasos sanguíneos de grande calibre, como a arterite de Takayasu, afeta a aorta e as suas ramificações principais. A vasculite em vasos sanguíneos de médio calibre afeta tipicamente as artérias que irrigam os rins, os intestinos, o cérebro ou o coração (por exemplo, poliarterite nodosa, doença de Kawasaki). A doença em vasos sanguíneos de pequeno calibre afeta vasos sanguíneos mais pequenos incluindo capilares (por exemplo, púrpura de Henoch-Schönlein, granulomatose com poliangeíte, síndrome de Churg-Strauss, vasculite leucocitoclástica cutânea, poliangeíte microscópica).

2.2 Quais são os principais sintomas?
Os sintomas da doença variam de acordo com o número total de vasos sanguíneos inflamados (generalizada ou afetando apenas alguns locais) e com a sua localização (órgãos vitais, tais como o cérebro ou o coração, em contraposição da pele ou do músculo), assim como o grau de comprometimento do aporte sanguíneo. Isto pode variar desde uma diminuição transitória mínima do fluxo sanguíneo até à sua oclusão total, com as alterações subsequentes no tecido não irrigado, causadas pela falta de oxigénio e fornecimento de nutrientes. Isto pode eventualmente causar danos nos tecidos com as subsequentes cicatrizes. A extensão dos danos nos tecidos indica o grau de disfunção do tecido ou órgão. Os sintomas típicos estão descritos abaixo nas seções correspondentes a cada doença.

2.3 Como é diagnosticada?
Normalmente, o diagnóstico de vasculite é difícil. Os sintomas podem assemelhar-se aos de outras doenças pediátricas mais comuns. O diagnóstico baseia-se na avaliação dos sintomas clínicos por um especialista juntamente com os resultados das análises sanguíneas e à urina e dos exames de imagiologia (como ecografias, Raios-X, TC e RM ou angiografia). Quando apropriado, o diagnóstico é confirmado por biópsias dos tecidos e órgãos envolvidos e mais acessíveis. Devido à raridade destas doenças, é frequentemente necessário transferir a criança para um centro onde exista reumatologia pediátrica, assim como outras subespecialidades pediátricas e especialistas em imagiologia.

2.4 Há tratamento para a doença?
Sim, atualmente as vasculites podem ser tratadas, embora alguns casos mais complicados representem um verdadeiro desafio. Na maioria dos doentes tratados adequadamente, é possível o controlo (remissão) da doença.

2.5 Quais são os tratamentos?
O tratamento das vasculites primárias crónicas é complexo e de longa duração. O seu objetivo principal é controlar a doença o mais rapidamente possível (tratamento de indução) e manter o controlo a longo prazo (tratamento de manutenção), evitando ao mesmo tempo efeitos secundários desnecessários. Os tratamentos são escolhidos numa base estritamente individualizada, de acordo com a idade do doente e com a gravidade da doença.
Os corticosteróides em combinação com fármacos imunossupressores, tais como a ciclofosfamida, provaram ser mais eficazes a induzir a remissão da doença.
Os medicamentos utilizados frequentemente no tratamento de manutenção incluem: azatioprina, metotrexato, micofenolato de mofetil e baixas doses de prednisona. Vários outros medicamentos podem ser utilizados para suprimir o sistema imunitário ativado e combater a inflamação. São escolhidos numa base estritamente individualizada, normalmente quando outros medicamentos mais comuns falharam. Estão incluídos os novos agentes biológicos (por exemplo, inibidores do TNF e rituximab), a colchicina e a talidomida.
No tratamento prolongado com corticosteróides, deve prevenir-se a osteoporose através do aporte suficiente de cálcio e vitamina D. Podem ser prescritos medicamentos que previnem a coagulação do sangue (por exemplo, dose baixa de aspirina ou anticoagulantes) e, nos casos de hipertensão arterial, também estão indicados medicamentos para controlo da tensão arterial.
Pode ser necessária fisioterapia para melhorar a função musculoesquelética, ao mesmo tempo que o apoio psicológico e social ao doente e à família os ajuda a lidar com o stress e tensões de uma doença crónica.

2.6 E os tratamentos não convencionais/complementares?
Existem muitos tratamentos complementares e alternativos disponíveis e isto pode ser confuso para os doentes e para as suas famílias. Avalie cuidadosamente os riscos e os benefícios de experimentar estes tratamentos uma vez que existem poucos benefícios comprovados e podem ser dispendiosos, tanto em termos de tempo, desconforto para a criança e financeiros. Se pretender saber mais sobre tratamentos complementares e alternativos, é aconselhável discutir essas opções com o seu reumatologista pediátrico. Alguns tratamentos podem interagir com os medicamentos convencionais. A maioria dos médicos não se oporá a tratamentos complementares, desde que siga as indicações médicas. É muito importante não parar de tomar os medicamentos receitados. Quando são necessários medicamentos para manter a doença sob controlo, tais como corticosteróides, pode ser muito perigoso parar de os tomar caso a doença ainda esteja ativa. Fale com o médico do seu filho sobre preocupações que tenha em relação à medicação.

2.7 Reavaliações
O principal objetivo de um acompanhamento periódico é avaliar a atividade da doença, a eficácia e possíveis efeitos secundários do tratamento, de modo a obter o máximo benefício para o seu filho. A frequência e o tipo de consultas de acompanhamento dependem do tipo e da gravidade da doença, assim como dos fármacos utilizados. Na fase inicial da doença, as consultas de ambulatório são típicas e, em casos mais complicados, os internamentos podem ser mais frequentes. Geralmente, estas consultas tornam-se menos frequentes à medida que se consegue controlar a doença.
Existem várias formas de avaliar a atividade da doença na vasculite. Pode ser-lhe pedido que informe sobre quaisquer alterações na doença do seu filho e, em alguns casos, que faça um acompanhamento da sua urina utilizando um teste de tiras e que avalie a sua tensão arterial. Um exame clínico detalhado juntamente com a análise dos sintomas do seu filho constituem uma parte importante da avaliação da atividade da doença. São realizadas análises sanguíneas e à urina para detetar a atividade da inflamação, alterações nas funções dos órgãos e possíveis efeitos secundários dos medicamentos. Com base no envolvimento de cada órgão interno, podem ser realizados vários outros exames por diferentes especialistas, podendo ser necessários estudos de imagiologia.

2.8 Quanto tempo durará a doença?
As vasculites primárias raras têm uma longa duração; por vezes duram toda a vida. Podem começar de forma aguda, muitas vezes grave ou mesmo fatal, e subsequentemente evoluem para uma forma mais crónica e de menor intensidade.

2.9 Qual é a evolução a longo prazo (prognóstico) da doença?
O prognóstico das vasculites primárias raras é muito variável de indivíduo para indivíduo. Depende não só do tipo e extensão do envolvimento dos vasos sanguíneos e dos órgãos envolvidos, mas também do intervalo entre o início da doença e o início do tratamento, assim como da resposta individual ao tratamento. O risco de lesões nos órgãos está relacionado com a duração da doença ativa. As lesões em órgãos vitais podem ter consequências para toda a vida. Com o tratamento adequado, é frequentemente possível alcançar remissão clínica durante o primeiro ano. A remissão pode ser para toda a vida mas é habitualmente necessário tratamento de manutenção de longa duração. Os períodos de remissão da doença podem ser interrompidos devido a recidivas da doença, as quais necessitam de tratamento mais intensivo. Se não for tratada, a doença apresenta um risco de vida relativamente alto. Devido à raridade da doença, os dados exatos sobre a evolução a longo prazo são escassos.


3. VIDA QUOTIDIANA

3.1 De que forma pode a doença afetar o dia-a-dia da criança e da sua família?
O período inicial, quando a criança não está bem e o diagnóstico ainda está por ser feito, é habitualmente de muita tensão para toda a família.
Compreender a doença e o seu tratamento ajuda os pais e a criança a lidar com um diagnóstico muitas vezes desagradável, com os procedimentos terapêuticos e as visitas frequentes ao hospital. Assim que a doença estiver sob controlo, a vida escolar e em casa regressam geralmente ao normal.

3.2 E a escola?
Assim que a doença estiver razoavelmente sob controlo, os doentes serão incentivados a voltar à escola, o mais cedo quanto possível. É importante informar a escola sobre a doença da criança, para que possa ser tida em consideração.

3.3 E em relação à prática de desportos?
Assim que a remissão da doença for alcançada, as crianças serão incentivadas a participar nas suas atividades desportivas favoritas.
As recomendações podem variar de acordo com a possível presença de disfunção dos órgãos, incluindo os músculos, articulações e estado dos ossos, os quais podem ser influenciados pela utilização prévia de corticosteróides.

3.4 E em relação à alimentação?
Não existem evidências de que uma alimentação especial possa influenciar a evolução e o prognóstico da doença. Uma alimentação saudável e bem equilibrada com proteínas, cálcio e vitaminas suficientes é recomendada para uma criança em crescimento. Enquanto um doente estiver sob tratamento com corticosteróides, a ingestão de alimentos doces, salgados ou gordos deve ser limitada de modo a minimizar os efeitos secundários dos mesmos.

3.5 O clima pode influenciar a evolução da doença?
Desconhece-se que o clima influencie a evolução da doença. Nos casos de alterações na circulação, principalmente nos casos de vasculite dos dedos das mãos e dos pés, a exposição ao frio pode agravar os sintomas.

3.6 E em relação às infeções e vacinas?
Algumas infeções podem ter um prognóstico mais grave em indivíduos tratados com fármacos imunossupressores. Em caso de contacto com varicela ou herpes zoster, deve contactar o seu médico imediatamente para receber medicamentos antivirais e/ou imunoglobulina específica anti-vírus. O risco de infeções comuns pode ser ligeiramente mais elevado nas crianças sob tratamento. Podem também desenvolver infeções atípicas por agentes que não afetam os indivíduos com um sistema imunitário totalmente funcional. Por vezes, são administrados antibióticos (cotrimoxazol) a longo prazo para prevenir infeções pulmonares causadas por bactérias denominadas Pneumocystis, as quais podem determinar complicações potencialmente fatais em doentes imunossuprimidos.
Vacinas vivas (por exemplo, anti-parotidite, anti-sarampo, anti-rubéola, anti-poliomielite, anti-tuberculose) devem ser adiadas em doentes tratados com imunossupressores.

3.7 E em relação à vida sexual, à gravidez e à contraceção?
Nas adolescentes sexualmente ativas, a contraceção é importante, uma vez que a maioria dos medicamentos utilizados pode causar problemas no feto em desenvolvimento. Existem preocupações de que alguns fármacos citotóxicos (principalmente a ciclofosfamida) possam afetar a capacidade do doente em ter um filho (fertilidade). Isto depende principalmente da dose total (cumulativa) do medicamento recebido ao longo do período de tratamento e é menos relevante, quando o medicamento é administrado em crianças ou adolescentes.


4. POLIARTERITE NODOSA

4.1 O que é?
A poliarterite nodosa (PAN) é uma forma de vasculite que destrói a parede dos vasos sanguíneos (necrosante), afetando principalmente as artérias de pequeno e médio calibre. As paredes dos vasos de muitas ("poli") artérias - poliarterite - são afetadas numa distribuição em placas. As partes inflamadas das paredes da artéria tornam-se mais fracas e ficam sob pressão do fluxo sanguíneo, formando-se pequenas cavidades nodulares tipo balão (aneurismas) ao longo da artéria. Daí a origem do nome "nodosa". A poliarterite cutânea (pele) afeta principalmente a pele e o tecido musculoesquelético (por vezes também os músculos e as articulações), e não os órgãos internos.

4.2 É uma doença comum?
A PAN é muito rara nas crianças com um número estimado de novos casos anuais de um por cada milhão de pessoas. Afeta igualmente rapazes e raparigas, e é mais frequente em crianças com idades entre os 9 e os 11 anos. Nas crianças, pode estar associada a infeção estreptocócica ou, muito menos frequentemente, também a hepatite B ou C.

4.3 Quais são os principais sintomas?
Os sintomas gerais (constitucionais) mais comuns são febre prolongada, mal-estar, fadiga e perda de peso.
A variedade de sintomas localizados depende dos órgãos afetados. Um fornecimento insuficiente de sangue aos tecidos causa dor. Como tal, a dor em vários locais pode ser um sintoma principal de PAN. Nas crianças, as dores musculares e articulares são tão frequentes quanto a dor abdominal, a qual é devida ao envolvimento das artérias que irrigam o intestino. Se os vasos sanguíneos que irrigam os testículos estiverem afetados, também pode ocorrer dor escrotal. A doença cutânea pode apresentar-se sob várias formas, desde erupções indolores com diferentes aparências (por exemplo, erupção irregular chamada púrpura ou manchas de pele arroxeada chamadas livedo reticularis) até nódulos de pele dolorosos e até mesmo úlceras ou gangrena (perda total de irrigação sanguínea causando lesões em locais periféricos incluindo dedos das mãos, dedos dos pés, orelhas ou ponta do nariz). O envolvimento renal pode causar presença de sangue e proteínas na urina e/ou tensão arterial elevada (hipertensão). O sistema nervoso também pode ser afetado num grau variável e a criança pode ter convulsões, acidente vascular cerebral ou outras alterações neurológicas.
Em alguns casos graves, a doença pode agravar muito rapidamente. Os exames laboratoriais revelam marcadores elevados de inflamação no sangue, assim como uma contagem elevada de leucócitos (leucocitose) e um nível baixo de hemoglobina (anemia).

4.4 Como é diagnosticada?
De modo a poder considerar um diagnóstico de PAN, devem ser excluídas outras possíveis causas da febre persistente na infância, assim como as infeções. O diagnóstico é então suportado pela persistência de manifestações sistémicas e localizadas apesar do tratamento antimicrobiano, o qual geralmente é administrado a crianças com febre persistente. O diagnóstico é confirmado pela demonstração de alterações nos vasos sanguíneos através de exames de imagiologia (angiografia) ou pela presença de inflamação na parede dos vasos sanguíneos na biópsia de tecidos.
A angiografia é um método radiológico no qual os vasos sanguíneos que não são observados em Raios-X comuns são visualizados devido ao meio de contraste que foi injetado diretamente na corrente sanguínea. Este método é conhecido como angiografia convencional. Também pode ser utilizada tomografia computadorizada (angiografia por TC).

Qual é o tratamento?
Os corticosteróides continuam a ser o tratamento de eleição da PAN na infância. O modo de administração destes medicamentos (muitas vezes diretamente nas veias, quando a doença está muito ativa, posteriormente sob a forma de comprimidos), a dose e a duração do tratamento são adaptadas individualmente de acordo com uma avaliação cuidadosa da extensão e gravidade da doença. Quando a doença está limitada à pele e ao sistema músculoesquelético, podem não ser necessários outros medicamentos supressores das funções imunitárias. No entanto, nos casos de doença grave e envolvimento de órgãos vitais, é necessária a adição precoce de outros fármacos, geralmente a ciclofosfamida, de modo a controlar a doença (designado por tratamento de indução). Nos casos de doença grave e não responsiva, são por vezes utilizados outros medicamentos, incluindo agentes biológicos, mas a sua eficácia na PAN ainda não foi formalmente estudada.
Assim que a atividade da doença estabiliza, é mantida sob controlo através do tratamento de manutenção, geralmente com azatioprina, metotrexato ou micofenolato de mofetil.
Tratamentos adicionais, utilizados individualmente, incluem a penicilina (no caso de doença pós-estreptocócica), medicamentos que dilatam os vasos sanguíneos (vasodilatadores), anti-hipertensores, medicamentos contra a formação de coágulos (aspirina ou anticoagulantes) e analgésicos (medicamentos anti-inflamatórios não-esteróides, AINEs).


5. ARTERITE DE TAKAYASU

5.1 O que é?
A arterite de Takayasu (AT) afeta principalmente artérias de grande calibre, em especial a aorta e as suas ramificações e as ramificações principais da artéria dos pulmões (pulmonar). Por vezes, os termos vasculite "granulomatosa" ou "de células gigantes", são utilizados para referir a característica microscópica principal das pequenas lesões nodulares formadas em redor de um tipo especial de células grandes ("células gigantes") na parede da artéria. Em determinadas fontes bibliográficas também é referida como 'doença sem pulso', uma vez que em alguns casos a pulsação nas extremidades podem ser desigual ou não existir.

5.2 É uma doença comum?
Em todo o mundo, a AT é considerada relativamente frequente devido à sua ocorrência mais comum na população não caucasiana (principalmente asiática). É muito rara em Europeus. Afeta as raparigas (normalmente durante a adolescência) mais frequentemente do que os rapazes.

5.3 Quais são os principais sintomas?
Os sintomas iniciais da doença incluem febre, perda de apetite, perda de peso, dores musculares e das articulações, dores de cabeça e suores noturnos. Os marcadores laboratoriais de inflamação estão aumentados. À medida que a inflamação arterial progride, podem ser detetados sinais de menor aporte sanguíneo. Uma tensão arterial aumentada (hipertensão) é um sintoma inicial muito frequente na doença na infância devido ao envolvimento das artérias abdominais, afetando o aporte de sangue para os rins. A perda de pulsação nos membros periféricos, diferenças de tensão arterial nos diferentes membros, sopros ouvidos através do estetoscópio nas artérias estreitadas e dores agudas nas extremidades (claudicação) são sinais comuns. Dor de cabeça, vários sintomas neurológicos e oftalmológicos podem ser uma consequência do aporte sanguíneo ao cérebro comprometido.

5.4 Como é diagnosticada?
O exame ecográfico com Doppler (para avaliação do fluxo sanguíneo) é útil como método de rastreio ou de acompanhamento para detetar o envolvimento dos troncos arteriais próximos do coração, embora, muitas vezes, não consiga detetar o envolvimento de artérias mais periféricas.
A imagiologia por ressonância magnética (RM) da estrutura dos vasos sanguíneos e do fluxo sanguíneo (angiografia por RM, ARM) é o método mais adequado para visualizar artérias de grande calibre tais como a aorta e as suas ramificações principais. Para poder visualizar vasos sanguíneos de menor calibre, pode ser utilizada imagiologia por Raios-X, na qual os vasos sanguíneos são visualizados devido ao meio de contraste (que foi injetado diretamente na corrente sanguínea). Este método é conhecido como angiografia convencional.
Também pode ser utilizada tomografia computorizada (angiografia por TC). A medicina nuclear dispõe de um exame chamado PET (tomografia por emissão de positrões). É injetado um isótopo radioativo na veia e gravado através de um scanner. A acumulação do isótopo radioativo nos locais ativamente inflamados demonstra o grau de envolvimento da parede arterial.

5.5 Qual é o tratamento?
Os corticosteróides continuam a ser o tratamento de eleição da AT na infância. O modo de administração destes medicamentos, a dose e a duração do tratamento são adaptadas individualmente, de acordo com uma avaliação cuidadosa da extensão e gravidade da doença. Outros agentes supressores do sistema imunitário são utilizados frequentemente no início da evolução da doença, de modo a minimizar a necessidade de corticosteróides. Os medicamentos utilizados frequentemente incluem azatioprina, metotrexato ou micofenolato de mofetil. Nos casos de doença grave, é utilizada inicialmente a ciclofosfamida de modo a controlar a doença (designado por tratamento de indução). Nos casos de doença grave e não responsiva, são por vezes utilizados outros medicamentos, incluindo agentes biológicos (tais como bloqueadores do TNF ou tocilizumab) mas a sua eficácia na AT na infância ainda não foi formalmente estudada.
Tratamentos adicionais utilizados individualmente incluem medicamentos que dilatam os vasos sanguíneos (vasodilatadores), anti-hipertensores, medicamentos contra a formação de coágulos (aspirina ou anticoagulantes) e analgésicos (medicamentos anti-inflamatórios não-esteróides, AINEs).


6. VASCULITES ASSOCIADAS AO ANCA: Granulomatose com poliangeíte (Wegener, GPA) e poliangeíte microscópica (PAM)

6.1 O que é?
A GPA é uma vasculite sistémica crónica que afeta principalmente os vasos sanguíneos de pequeno calibre e os tecidos das vias aéreas superiores (nariz e seios peri-nasais), das vias aéreas inferiores (pulmões) e dos rins. O termo "granulomatose" refere-se à aparência microscópica das lesões inflamatórias que formam pequenos nódulos com várias camadas, no interior e em redor dos vasos sanguíneos.
A PAM afeta vasos sanguíneos de menor calibre. Em ambos os caso, existe um anticorpo chamado ANCA (anticorpo anticitoplasma do neutrófilo). Como tal, as doenças são referidas como doenças associadas ao ANCA.

6.2 É uma doença comum? A doença nas crianças é diferente da doença nos adultos?
A GPA é uma doença pouco comum, especialmente na infância. A frequência real é desconhecida, mas provavelmente não excede 1 novo doente por 1 milhão de crianças anualmente. Mais de 97% dos casos ocorre na população branca (caucasiana). Nas crianças, ambos os sexos são afetados igualmente.

6.3 Quais são os principais sintomas?
Numa grande proporção de doentes, a doença apresenta-se com congestão nasal que não melhora com antibióticos nem com descongestionantes. Existe tendência para formação de crostas no septo nasal, hemorragias e ulcerações causando, por vezes, uma deformação conhecida como nariz em sela.
A inflamação das vias aéreas abaixo das cordas vocais pode causar estreitamento da traqueia, causando uma voz rouca e problemas respiratórios. A presença de nódulos inflamatórios nos pulmões resulta em sintomas de pneumonia, com falta de ar, tosse e dor torácica.
O envolvimento renal está inicialmente presente apenas numa pequena percentagem de doentes, mas torna-se mais frequente à medida que a doença evolui, causando alterações nas análises à urina e sanguíneas da função renal, assim como hipertensão. O tecido inflamatório pode acumular-se por trás do globo ocular, empurrando-o para a frente (protrusão), ou no ouvido médio, causando otite média crónica. Sintomas gerais tais como perda de peso, fadiga, febre e suores noturnos são comuns, assim como várias manifestações cutâneas e músculoesqueléticas.
Na PAM, os rins e os pulmões são os principais órgãos afetados.

6.4 Como é diagnosticada?
Os sintomas clínicos de lesões inflamatórias nas vias aéreas superiores e inferiores, juntamente com doença renal, manifestada normalmente pela presença de sangue e proteínas na urina e aumento dos níveis sanguíneos de substâncias libertadas pelos rins (creatinina, ureia), são muito suspeitos de GPA.
As análises sanguíneas geralmente indicam elevação de marcadores inflamatórios inespecíficos (VS, PCR) e níveis elevados de ANCA. O diagnóstico pode ser confirmado por uma biópsia de tecido.

6.5 Qual é o tratamento?
Os corticosteróides em combinação com a ciclofosfamida são a base do tratamento de indução da GPA/PAM. Outros agentes supressores do sistema imunitário, tais como o rituximab, podem estar indicados de acordo com a situação individual. Assim que a atividade da doença estabiliza, é mantida sob controlo através do tratamento de manutenção, geralmente com azatioprina, metotrexato ou micofenolato de mofetil.
Tratamentos adicionais incluem antibióticos (geralmente cotrimoxazol a longo prazo), anti-hipertensores, medicamentos contra a formação de coágulos (aspirina ou anticoagulantes) e analgésicos (medicamentos anti-inflamatórios não-esteróides, AINEs).


7. ANGEÍTE PRIMÁRIA DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL

7.1 O que é?
A Angeíte Primária do Sistema Nervoso Central (APSNC) na infância é uma doença inflamatória do cérebro que tem como alvo vasos sanguíneos de pequeno ou médio calibre do cérebro e/ou da medula espinal. A sua causa é desconhecida, embora em algumas crianças, a exposição prévia à varicela aumente a suspeita de que existe um processo inflamatório desencadeado por uma infeção.

7.2 É uma doença comum?
É uma doença muito rara.

7.3 Quais são os principais sintomas?
O início pode ser súbito, sob a forma de um distúrbio de movimento (paralisia) das extremidades de um dos lados (acidente vascular cerebral), convulsões de difícil controlo ou forte dor de cabeça. Por vezes, podem existir sintomas neurológicos ou psiquiátricos mais difusos, tais como alterações de humor e de comportamento. A inflamação sistémica, cursando com febre e marcadores inflamatórios sanguíneos elevados, normalmente está ausente.

7.4 Como é diagnosticada?
As análises sanguíneas e as análises do líquido cefalorraquidiano são inespecíficas e são utilizadas principalmente para excluir outras doenças que possam apresentar sintomas neurológicos, tais como infeções, outras doenças inflamatórias não-infeciosas do cérebro ou doenças da coagulação do sangue. As técnicas de imagiologia do cérebro ou da medula espinal, são os principais exames complementares de diagnóstico. A angiografia por ressonância magnética (ARM) e/ou a angiografia convencional (Raios-X) são utilizadas frequentemente para detetar o envolvimento de artérias de médio e grande calibre. São necessários exames periódicos para avaliar a evolução da doença. Quando não é detetado envolvimento arterial numa criança com lesões cerebrais progressivas sem causa aparente, deve suspeitar-se do envolvimento de vasos sanguíneos de pequeno calibre. Isto pode eventualmente ser confirmado através de uma biópsia cerebral.

7.5 Qual é o tratamento?
Na doença pós varicela, é geralmente suficiente um tratamento curto (cerca de 3 meses) com corticosteróides para impedir a progressão da doença. Se apropriado, também está indicado um medicamento antiviral (aciclovir). Um tratamento deste tipo, apenas com corticosteróides, pode ser suficiente para tratamento da doença não progressiva com angiografia positiva. Se a doença progredir (ou seja, as lesões cerebrais estiverem a agravar), então, um tratamento intensivo com medicamentos imunossupressores é vital para evitar mais lesões cerebrais. A ciclofosfamida é utilizada mais frequentemente na doença inicial aguda e em seguida, é substituída pelo tratamento de manutenção (por exemplo, azatioprina ou micofenolato de mofetil). Devem ser adicionados medicamentos que afetam a formação de coágulos sanguíneos (aspirina ou anticoagulantes).


8. OUTRAS VASCULITES E DOENÇAS SEMELHANTES

A vasculite leucocitoclástica cutânea (também conhecida como hipersensibilidade ou vasculite alérgica) caracteriza-se por uma inflamação dos vasos sanguíneos causada pela reação inadequada a uma fonte sensibilizante. Nas crianças, os medicamentos e infeções são desencadeadores comuns desta doença. Geralmente, afeta os vasos de pequeno calibre e tem uma aparência microscópica específica na biópsia da pele.

A vasculite urticariforme hipocomplementémica caracteriza-se por uma erupção cutânea que apresenta frequentemente prurido, urticária generalizada que não desaparece tão depressa como nas reações cutâneas alérgicas comuns. As análises sanguíneas apresentam níveis do sistema complemento diminuídos a acompanhar esta situação.

A poliangeíte eosinofílica (PAE, denominada anteriormente por síndrome de Churg-Strauss) é um tipo extremamente raro de vasculite nas crianças. Vários sintomas de vasculite na pele e nos órgãos internos são acompanhados por asma e por um aumento, no sangue e nos tecidos, do número de um tipo de glóbulos brancos conhecidos como eosinófilos.

A síndrome de Cogan é uma doença rara caracterizada pelo envolvimento dos olhos e do ouvido interno apresentando fotofobia, tonturas e perda de audição. Podem existir sintomas de vasculite mais generalizada.

A doença de Behçet foi discutida separadamente noutra secção.


 
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